domingo, 3 de outubro de 2010

Goma 19


A minha presença em frente ao espelho quase 3 X 4 do meu quarto coagula bem as saudades todas que tenho sentido. São as mais intensas, as mais caídas, as mais remotas e as mais recentes. Enquanto a madrugada chegava neste fim de semana em São Paulo, eu via através da névoa enfumaçada da sacada do apartamento do sétimo andar, o novesfora da minha vida, que parece querer recomeçar todo dia. Não sei se eu queria que essa madrugada fosse eterna ou que logo o Sol chegasse. Eu conheci de novo as minhas verdades de criança. E li nos olhos da pequena as alegrias da simplicidade. E comunguei das brincadeiras e me enchi de paz - uma paz que chegou a me inquietar. Chorei e pensei estar abandonada. Sonhei com feijão – o que Fabíola cozinhava à meia-noite. Acordei perto de meio-dia e quis o cafuné de Leo. Lavei roupas e contornei as sobrancelhas invejáveis de Luisa. Li alguma coisa sobre as fórmulas de Maingueneau, assisti mais uma vez “Foucault por lui même” – e tentei melhorar meu francês. Ouvi “Lady Madonna” e quis roteirizar um curta metragem. Pensei em meus novos caminhos e desejei, como nunca, que se tornem reais... e coloridos. Ainda me lembro do casal que conheci na casa de Pedro. Estão juntos há 20 anos e em seu convite de casamento a mais curiosa das escrituras: ela, com seu nome de batismo e ele, com o apelido sublinhado por “in memorian”. Nada tão apropriado quanto morrer para renascer! Talvez ao invés da produção cinematográfica eu me debruce sobre uma nova canção. De fato é inspirador. E ainda que não seja, como argumentava o professor na última aula, a minha alma me obriga a escrever. É o meu trabalho – é ele que me deixa afastar de mim o Thanatos do desespero. O sorriso de Lucas me faz muita falta. Em todas as horas. O carinho que não tenho tido das minhas princesas dog – Miucha, Mel, Lala, Nina – e do baby dog Ringo, me deixa rouca, me empalidece as bochechas. A distância das brincadeiras incansáveis e do dengo cheiroso e sem fim da minha mãe me torna tão menor, murcha o girassol do meu olho maduro. Saudade é mesmo uma palavra triste... Bem menos triste é solidão – essa que eu pareço não conhecer. Tenho gostado da minha companhia. E vou comigo agora retirar a roupa seca do varal. E fazer um capuccino para comer com bolo de pamonha. E olhar de novo o meu retrato vivo no 3 X 4 do meu quarto...


(Em 10 de agosto de 2010)

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